Um Simples Sonho
O vento sopra assobios finos e violentos. A casa está tão silenciosa que posso ouvir os meus pensamentos ecoar. A lareira está acesa e posso sentir o calor que dela emana. O cappuccino aquece-me os lábios e o cobertor aquece-me as pernas. Ouvir o crepitar, da lenha que se vai incendiando, desperta em mim memórias escondidas nos lugares mais recônditos da minha mente. O sono invade-me, mas esforço-me para me manter acordada. De repente, a nossa imagem toma conta de mim.
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Os nossos corpos a dançarem perto do calor da lareira. É de noite. Beijas-me toda e eu deixo. Deito-me de barriga para baixo como que a sugerir o próximo passo. Obedeces ao meu pensamento e posso sentir o teu sangue a pulsar, o teu coração a bater. Estás ofegante e nervoso. Posso ouvir o fecho do meu vestido a abrir-se lentamente. Sinto os teus dedos nas minhas costas e, por um instante, julguei que não existia nada mais erótico no mundo do que esta sensação. Tocas-me toda e eu deixo. Sou tua, toda tua. Não digo, mas penso e espero que oiças. Demorámo-nos um no outro e saboreámo-nos um ao outro. Só mais tarde, nua, derretida e cheia de desejo, me entreguei a ti. É incrível a vulnerabilidade do ser humano, mas foi ainda mais incrível a minha devoção e falta de medo. A parte mais maravilhosa foi o carinho com que me tomaste nos teus braços. Cuidaste de mim e amaste-me e nunca poderei agradecer-te por isso. Foi ali mesmo, estendidos em cima de um cobertor no chão da sala. Desejei-te, como sempre e ainda mais. Amámo-nos até que o fogo da lareira se apagasse. No escuro, foi ainda mais fácil encontrar-te e abraçar-te. Por isso, fiquei abraçada a ti durante o tempo que nos restou.
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Acordo. Ainda estou sentada no cadeirão com a caneca vazia nas minhas mãos. A lareira ainda estala e o meu coração ainda dispara. Ninguém sabe onde me encontro. Nem mesmo eu própria. Sinto uma imensa pena de mim, por sonhar contigo e saber que esse sonho não será real. Estás distante e eu também. Por agora, devo contentar-me com aquilo que temos. Temos o coração um do outro, e isso já significa tanto. Sorrio e choro ao mesmo tempo. É confuso e dói. Sozinha aqui, onde nem a noite me apanha. Puxo o cobertor para me cobrir melhor. O vidro continua embaciado do frio que ruge lá fora. E eu, sozinha. Sem ti. Soluços.
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Pergunto-me se também choras assim: sozinho e com frio. Espero que não. Quebrar-me-ia o coração saber-te triste. Talvez seja essa a razão de nunca te contar o quão triste me sinto às vezes, por não poder ter-te completamente, da forma que desejo ardentemente ter-te. Para sempre e para todo o sempre. Sem despedidas, nem lágrimas. E, principalmente, sem últimos beijos. Mas isto são só sonhos. E desejos.
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Lara Filipa xX