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Quero Conhecer-me

Eu quero voltar a conhecer-me. Mas não sei como.

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Hoje, o céu está pintado de um azul muito claro e salpicado de nuvens brancas. Há dias, como este, em que olhamos o céu e só queremos tocar aquelas nuvens e saber se são tão fofas como parecem ser. O silêncio paira no ar e, ao olhar através da janela posso ver um campo imenso e vazio. Observando as pessoas que passam na rua desta pequena cidade, eu posso dizer que é um dia tão calmo como todos os outros. Este verão está a acabar, mas o sol ainda bate nas janelas da minha casa de campo. É um dia bonito. Ainda assim, tão diferente de mim.

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Muitas vezes, os dias não são o espelho da alma. Não é que isso importe realmente, mas eu sinto a diferença quando saio da porta para fora. Sinto o contraste entre o meu coração, tão destruído pela vida, e o dia, que continua calmo, vivo e cheio de luz. Há dias assim, como hoje. Há dias em que eu sinto a escuridão que me assola e desejo voltar atrás no tempo, até aos dias em que eu ainda me conhecia e ainda sabia ser quem era. Há dias cheios de sol, como este. Olho pela janela e só quero correr pela relva fora e deitar-me nela, sentir a sua frescura a entrar em mim e ser feliz outra vez. Hoje e sempre. Não é assim que acontece. A imaginação do meu corpo a repousar no campo à luz do sol não é, de todo, real. Fico apenas do lado de dentro da casa de campo, a observar os pássaros que cantam e a saber que são felizes com o que têm. E têm tanto.

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Concentro o meu olhar no reflexo da janela e deixo para trás a bela paisagem. As olheiras matam-me toda a expressão, as rugas de pânico contrastam com a minha inexpressão e já não me reconheço. Eu começo então a pensar na linha da vida. A linha da vida é tão curta. Todos sabemos isso. Penso sobre quem será o próximo a partir e isso não é algo que eu consiga evitar. Penso nisso todos os dias da minha vida. O meu espírito, agora negro da tristeza que continua a contaminar o meu interior, não deixa entrar a luz do dia. Tornou-se opaco para me proteger dos sentimentos que me quebram a alma. O reflexo da minha cara na janela assusta-me. Assusta-me o facto de que eu não me conheço mais. Eu já não sei quem sou.

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Sinto falta dos dias em que a vida era fácil e os gestos faziam sentido. Saudades dos dias em que a cama era para dormir e não para me esconder. Sinto saudades de saber o que faria numa ou outra situação. Saudades de saber que sobreviverei aos piores pesadelos da história da humanidade. Sinto saudades de reconhecer em mim a força maior e um coração grande o suficiente para ajudar e acolher. A realidade é que essa realidade já não me pertence. Não faço ideia do que fazer a seguir e falta-me, no sangue, a vontade de seguir em frente. Não sei o que a vida me guarda ou o que devo esperar dela. Só queria voltar aos dias em que me conhecia e em que tinha alguém para me dizer que sabe quem eu sou.

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Hoje, o sol espalha a luz pelas ruas e eu fico trancada em casa a desejar a solidão. Não quero que saibam que eu já não me conheço. Tenho medo, tanto medo. Fecho as janelas, tranco as portas. A luz, hoje, ofusca-me. Queima-me. Fecho tudo. Deito-me e fico assim até adormecer.

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Quando partiste, levaste-me contigo. Volta. Devolve-me a parte de mim que me roubaste.

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Eu quero voltar a conhecer-me. Mas não sei como. E tenho tanto medo.

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Lara Filipa xX

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